segunda-feira, outubro 01, 2007

§1. Filosofia de Ponta - O Levantar de manhã

O que pensamos quando nos levantamos todas as manhãs? O leitor já pensou bem na 1ª palavra que lhe vem à cabeça quando acorda de manhã? Ou na primeira coisa que vê? Ou no primeiro som que ouve? É um exercício fácil, basta colocar um bloco de apontamentos e uma caneta ao pé da cama, e apontar logo que acorde (de preferência, mesmo antes de ir usar o WC, se der tempo). Já agora, junte-lhe a recordação imediata que tem dos sonhos dessa noite. Só para compor o ramalhete. Garantidamente, o resultado pode oscilar entre o mais perfeito non-sense, e o mais completo retrato da realidade humana. Ou os dois ao mesmo tempo, quem sabe. Senão vejamos: A primeira coisa que ouço de manhã são os meus gatos a raspar a porta do quarto. Significa, em primeiro lugar, que fechei a porta, antes de me deitar. Em segundo lugar, quer dizer que os bichanos têm fome. Isto tudo, significa que tenho gatos, o que pode dizer muito sobre a minha personalidade, ou sobre o meu estilo de vida. Se eu tiver um cão posso ouvi-lo ladrar, a pedir para ir à rua, e isso quer dizer que as minhas manhãs podem ser até muito refrescantes, porque começam sempre com um passeio ensonado em pijama, pela fresca, para levar o cãozinho a fazer as necessidades à rua, passando pelo apanhar das mesmas para um saco, pôr no lixo, e voltar para casa para lavar as mãos. Se eu fizer isto assim, até sou uma pessoa civilizada, se não, sou uma javarda sem responsabilidade social nenhuma (enfie a carapuça quem quiser...). Se não tenho animais de estimação, ou tenho mas são dos que não batem à porta (pequenos roedores, peixinhos num aquário, répteis, insectos, um tamagoshi ou até mesmo um animal embalsamado), a primeira coisa que se ouve de manhã pode ser qualquer coisa, e normalmente vem da rua ou da casa dos vizinhos - obras, carros, assobios, despertadores, rádios, coisas a cair (e a partir), pessoas a escarrar glamorosamente nos seus WC, bébés a chorar, autoclismos... uma parafernália de sons das mais variadas origens, que mais dizem sobre o tipo de casa e de localização em que vivemos, do que sobre nós próprios. E, claro, destes sons depende a primeira coisa que nos vem à cabeça assim que abrimos os olhos para o mundo. E esta depende ainda de como temos o quarto em que dormimos. E do stress em que andamos, e ainda do que fizemos antes de adormecer. O quarto. Escuro como breu, desarrumado até ao tecto? O seu proprietário gostaria de ficar a dormir até ao meio dia, por isso, se acorda mais cedo, pensa "Bolas... já é de manhã...", ou coisa pior. Janela aberta, luz do dia a entrar às 7h da matina (sem ter sido por esquecimento de a fechar)? Ah, aí então temos um madrugador, que pensa "ora vamos lá, mais um dia!", ao mesmo tempo que se levanta da cama, com pulo ou sem ele. Mas aqui ainda temos uma variante: aqueles que programam o despertador para mais cedo do que é preciso, e gostam de deixar a luz entrar, para gozar aqueles 30 minutinhos de puro prazer que é o acordar lentamente para a vida. Sorna pura. Depois, o nosso primeiro pensamento do dia passa pelos sons - se acordamos estremunhados com uma barulheira infernal vinda de fora (Comboio, businas, rectro-escavadoras, uma vizinha que canta mal, berros, um buzzer insistente, música foleira, o Family Frost, anúncios de touradas e circos, uma banda de música ou zés-pereiras), acordamos irritados e a pensar que temos que mudar de casa rapidamente; se a barulheira vem de dentro de casa, acordamos ainda mais irritados, e ainda por cima apreensivos com a causa do barulho - alguma coisa correu mal, e aí o salto da cama é peremptório, assim como toda a manhã pode ficar arruinada, dependendo do estrago produzido e da possibilidade de culpar alguém. Mas o que ouvimos pode ser bom, suave e melodioso. O nosso despertador pode contribuir para isso, com a nossa música preferida, o nosso ente amado pode simplesmente sussurrar ao nosso ouvido coisas românticas, ou o nosso filho pode vir acordar-nos com um beijo. O ronronar de um gato com fome também serve. Latidos e lambidelas de cão, não obrigada, mas para quem gosta... Whatever. Se andamos stressados, acordamos a pensar nos problemas, nas urgências, nas chatices. É aborrecidíssimo, estraga, pelo menos, a manhã, e faz rugas e cabelos brancos. Mas acontece amiúde a toda a gente, até mesmo nas crianças, de quem se diz que nunca tem problemas. Faz parte da nossa existência sermos nós próprios a martirizar-nos com coisas que não conseguimos resolver durante o tempo em que estivemos a dormir - é uma fatalidade, dormir umas horas, poucas ou muitas não interessa, e acordar a constatar que o problema continua teimosamente na mesma, não se resolveu, apesar de estarmos a acordar para um novo dia. Nos meus tempos de estudante, a maior parte das vezes sonhava que estava a fazer os exames que tinha no dia a seguir, e acordava no alívio - durante 5 segundos - de já os ter feito. Depois era uma chatice ver que tinha que me levantar para ainda os ir fazer. O que fizemos antes de adormecer? Adormecemos frente à TV, a ler ou na internet (sim, há pessoas que levam os pc portáteis para a cama...), bebemos demais, fizemos amor, adormecemos ao lado de um filho com insónias? às vezes, os próprios sonhos dependem disso, mais ainda a maneira como acordamos. Por exemplo, se adormecemos no sofá em frente à TV, acordamos cheios de dores nas cruzes, e pensamos "gaita para isto!"; Adormecer depois de fazer amor pode trazer um acordar cheio de mel (acordamos ao lado do nosso ente amado, e vivemos aquela sensação de profundo conforto do sentimento do amor, e pensamos "Amo-te"), ou não, dependendo do contexto em que aconteceu (quem nunca ouviu contar aqueles casos do famoso "Credo!! Mas quem é esta(e)?!" ). Adormecer a trabalhar, na internet ou a ler pode ser penoso, porque normalmente acordamos em cima de qualquer objecto menos confortável, e temos a pele vincada e magoada, e isso pode doer. Adormecer a tentar adormecer uma criança, pode trazer um acordar muito ternurento, ou então também pode gerar um acordar súbito, se a criança acorda primeiro e calha de se assustar... Os sonhos, esses, há muito quem os tente interpretar, mas eu não percebo nada disso. Raramente me lembro do que sonhei, e quando me lembro é mau sinal, porque foi um pesadelo, e acordei sobressaltada e a pensar em coisas terríveis. Detesto quando isso acontece. Mas influem na nossa maneira de acordar, os sonhos. Para quem se recorda sempre deles, podem determinar um dia cheio de positividade, ou um dia péssimo. Se sonhamos com coisas boas, só podemos esperar que o nosso dia seja assim, na mesma medida; se sonhamos com coisas más, temos que passar o dia a evitar que aconteçam coisas dessas, que é especialmente possível que aconteçam, dada a nossa propensão para o negativo. O Feng Shui (China), é uma arte que estuda a análise da energia ou força viva que existe no universo, na natureza e nos objectos, e pode influir na nossa maneira de acordar de manhã. Um posicionamento correcto do quarto e seus objectos pode afastar o negativismo e fazer-nos acordar de manhã a pensar em coisas boas. Para mim, os quartos deviam ser todos voltados para Nascente, para que se possa acordar com a luz do sol da manhã. Mas nem todas as casas permitem isto, já se sabe. E nem todas as pessoas se levantam a horas de ver o sol despontar de manhã - há quem se levante bem mais cedo, e há quem se levante bem mais tarde. Acordar ainda de noite é aborrecido para o cidadão normal, mas uma necessidade profissional para muitos - quando se torna um hábito, calculo que não trará negativismo, não sei. Todas as vezes que tenho que me levantar ainda de noite, acordo com um mau feitio monumental, a pensar em esganar alguém, e por isso não faço isso muitas vezes. Quem não gosta de levantar cedinho, com os primeiros raios de sol? Ok, muita gente não gosta, prefere ser acordado com a expressão "ACORDA; ANDA ALMOÇAR!!!!". São gostos. Pelo menos assim, acorda-se a pensar em comida, até que nem é mau. Seja como for, pelo menos para mim, a maneira como se acorda, o que se pensa, o que se ouve, influi em muito no que se faz, e como se faz, a seguir. Tal e qual como quando se começa uma nova vida - o que fizemos antes vai determinar o que vamos fazer depois. Mais, o perfil do indivíduo pode ser maioritariamente caracterizado de uma maneira, mas este pode experienciar, em diversas fases da sua vida, outras. Eu posso ser uma pessoa muito calma, e ter um acordar sempre bem-disposto, mas posso ter dias em que acordo com a telha. Acontece, somos humanos, e complicados, por alguma razão.
(c) Bluerussian