quarta-feira, agosto 30, 2006

Fresh red roses

Coisas que acontecem.
De facto, há coisas na vida que surgem do nada, instalam-se, mudam tudo o que existe e ficam. Provavelmente para sempre. E felizmente para nós.
Num dia, estando nós a gozar a nossa existência, mais serenamente ou não, mais feliz ou menos, somos surpreendidos pelo próprio destino, que nos põe à frente, assim de repente, um mar de hipóteses, novas e absolutamente irresistíveis; o que temos diante dos olhos é a possibilidade de mudar tudo aquilo em que acreditávamos até aí, e seguir um novo trajecto. Estranho, assustador, desconhecido, mas absolutamente irresistitível. Sem olhar para trás, sem reservas e sem medo, entramos nessa àgua morna do destino, e submergimo-nos sem sequer notar que a àgua que nos inunda os pulmões é o nosso novo oxigénio.
Sem medo.
Sem dúvida.
Entregamo-nos às mãos do destino como uma criança se entrega às mãos dos pais. Porque sabemos com toda a certeza que é exactamente isso que estava reservado para nós. Sabemos que é aí que reside a nossa felicidade.
Por muito que tenhamos questionado a nossa própria sorte, deparamo-nos com a mais límpida e absoluta certeza de que o que queremos é exactamente aquilo que temos diante dos olhos.
E porque não agarrar o destino? Seria um profundo erro deixá-lo fugir, inutilizando-o.
Só teríamos a perder com isso.
Tempo?
Relativo. Não se colocam prazos à felicidade.
Mais ou menos tempo, a alma e o ser ditam os momentos certos.
Não os relógios, nem os calendários.
Agora sei isso, M.

sexta-feira, agosto 18, 2006

"O mendigo Sexta-feira jogando no mundial"

"(...) O que me inveja não são esses jovens, esses fintabolistas, todos cheios de vigor. O que eu invejo, doutor, é quando o jogador cai no chão e se enrola e rebola a exibir bem alto as suas queixas. A dor dele faz parar o mundo. Um mundo cheio de dores verdadeiras pára perante a dor falsa de um futebolista. As minhas mágoas que são tantas e tão verdadeiras e nenhum árbitro manda parar a vida para me antender, reboladinho que estou por dentro, rasteirado que fui pelos outros. Se a vida fosse um relvado, quantos penalties eu já tinha marcado contra o destino? (...)
Mia Couto, in "O fio das Missangas"

segunda-feira, agosto 14, 2006

Aquela Palavra

Há palavras vãs. Há palavras sem sentido, ditas à pressa e sem olhar a quem. Há palavras das quais temos medo, e outras que nos irritam. Mas também há palavras que nos fazem pairar no limbo do sonho, quer quando as dizemos, quer quando as ouvimos.
São palavras, e podem valer mais que os actos. Ou não, talvez às vezes não.
Dizer aquilo que vai na alma pode ser tão acutilante e tão definitivo como qualquer acto. Uma promessa, uma jura, um pedido, a expressão de um sentimento, podem gerar todo um mar de emoções, que podem determinar a felicidade, ou a falta dela, a quem as ouve.
"Palavras leva-as o vento". Não, algumas, não leva. Algumas, ficam gravadas na alma a ferro e fogo, e marcam toda uma existência a partir do preciso momento em que são proferidas e ouvidas.
Muitas vezes, têm a particularidade de marcar duas vidas em simultâneo.
Como Aquela Palavra.
Aquela, ontem. Tu sabes.

quinta-feira, agosto 10, 2006

Razão perdida

Noite que se faz dia, maré de lua,
dia que amanhece para anoitecer;
Luz de seda, madrepérola,
voz de veludo,
força bruta que arrebata a razão.
Anel de fogo que incendeia a alma
furacão que alimenta a minha sede de ti.
Pele que chama.
Olhar que se fecha.
Sangue que grita...
Num turbilhão de brisas,
a ansia de um simples gesto.
Áurea de brilho intenso,
procura o colo macio da paixão,
tentando calar o clamor que cresce no peito.
Bluerussian

sábado, agosto 05, 2006

Pensou

Pensou.

Que o mundo tinha mudado,

assim como o seu próprio destino. Achou que a cor deixara de ser translúcida. Quis, por um momento só, que fosse assim. Fechou os olhos e sentiu a brisa quente do fim do inverno, Sentiu o limbo envolvente da paz de espírito. Mas não. Acordou um dia e, abrindo os olhos, viu que não. O mundo estava lá. Frio e presente, envolvendo-a como um pesado manto. Sempre esteve, e não deixará nunca de estar. Não se admirou. No fundo, sabia que era assim. Acreditou apenas que podia ser diferente. 5 Abril 2006